domingo, 28 de outubro de 2007

ESQUIZOFRENIA



2007-10-28 - 00:00:00
Esquizofrenia ausência de apoios castiga doentes


Para os doentes a quem a Medicina entendeu chamar de esquizofrénicos, a distinção entre realidade e imaginação torna-se tarefa difícil e os momentos de alucinação acabam por ser partilhados por toda a família. Tudo porque, em Portugal, a maioria destes doentes vive a cargo da família, obrigada a enfrentar a doença sem apoios.


É para a falta de ajudas que Marques Teixeira, director clínico do Centro Hospitalar Conde Ferreira, no Porto, chama a atenção. Fala no “estigma” que ensombra a sociedade, com manifestações “que se estendem desde o nível político ao senso comum”. Para este especialista, é preciso, acima de tudo, mudar mentalidades, já que os esquizofrénicos “são doentes e pessoas que têm direito a ser tratadas como tal”.Tal como acontece noutros países ditos desenvolvidos, cabe às famílias a dura tarefa de cuidar dos doentes. Para os que se vivem sozinhos, sem apoio familiar, pouco mais resta do que as estadias nos hospitais psiquiátricos ou, em alternativa, a marginalidade. “Como não há uma rede de suporte que cuide destas pessoas, muitas acabam nas ruas, como sem-abrigo, fenómeno que ocorre com cada vez maior frequência na Europa.” Tendo em conta a ameaça de encerramento que paira sobre as unidades de cuidados psiquiátricos nacionais, Teixeira Marques teme que esta realidade chegue em breve a Portugal.Pede-se, por isso, mais meios e uma maior alocação de recursos. “Estamos praticamente a zero quando se trata da rede de apoio comunitário, necessária para apoiar os doentes nas famílias”, avança o médico. E a justificação para a falha é simples: “Deficientes políticas de saúde mental”, um problema que não é recente.Outras questões põem em causa a qualidade de vida de quem sofre com esquizofrenia, como o número de camas disponíveis nos hospitais ou a questão da reabilitação e integração social. Se há doentes para quem este cenário não é possível, outros há que, com o devido apoio médico e psicológico, têm a possibilidade de ocupar um lugar produtivo na sociedade. Para isso são necessários programas e estruturas de apoio que, segundo Marques Teixeira, “não existem em Portugal”.

BRILHO QUE A DOENÇA NÃO APAGOU

Chama-se John Nash Jr., é norte-americano e sofre de esquizofrenia, diagnóstico que não apagou, no entanto, o brilho de uma mente considerada por muitos genial. Nash podia ser mais um nome a juntar ao de tantos outros doentes no Mundo, mas saltou para a ribalta depois de, em 1994, ter ganho o Nobel da Economia graças a uma tese de doutoramento na área da Matemática, escrita décadas antes. Começou cedo a interessar-se pela ciência dos números, que o levou longe na carreira académica, apenas interrompida, no início da década de 60, por uma esquizofrenia paranóica, combatida por tratamentos que incluíram o internamento. Tornou-se o exemplo do potencial de quem sofre com este problema, retratado pela indústria de Hollywood no filme ‘Uma Mente Brilhante’.

USO DE CANNÁBIS LEVA A CRISES PSICÓTICAS

Há indícios que apontam para a possibilidade de o consumo de canábis poder provocar crises psicóticas e já foi demonstrado que o contacto com as drogas favorece o aparecimento da esquizofrenia quando já existe predisposição para a doença.Outros estudos revelam, porém, que os doentes têm, por motivos ainda pouco claros, maior tendência para o consumo de tóxicos. Independentemente de quem tenha razão, há uma certeza: consumir droga piora o prognóstico da doença, o que levou as Nações Unidas a pedirem o fim da tolerância dos países mais desenvolvidos em relação ao consumo de algumas substâncias, como o álcool ou a canábis, considerado aceitável na maior parte das nações. E mesmo a canábis é legal e considerada inofensiva em alguns países.Muitos especialistas defendem que a possibilidade de sofrer de alucinações ou pensamentos delirantes que não se ajustam à realidade – sintomas da esquizofrenia – aumentam em quem consome regularmente drogas. Estes estudiosos não duvidam de que as drogas precipitam episódios psicóticos. Outros defendem que é a doença que favorece o consumo.

FACTOS E NÚMEROSCUSTOS ELEVADOS

A esquizofrenia é uma das doenças que mais contribui para a despesa com a saúde nos países desenvolvidos. Na Europa, estima-se que contribua com 1,9 por cento do total do orçamento para a saúde.

EM PORTUGAL

Estima-se que a esquizofrenia afecte entre 60 a 100 mil portugueses. De acordo com um estudo, 64,4 por cento dos doentes depende da família e só 18,6 por cento tem uma relação com um companheiro.

INSERÇÃO

Ainda de acordo com o mesmo estudo, 35 por cento dos doentes está no desemprego ou na reforma, enquanto 41,5 por cento diz não ter actividades sociais com amigos ou família.

TRATAMENTOS

Cerca de três quartos dos esquizofrénicos não sofrem recaídas no prazo de três anos, sinal da eficácia dos tratamentos.

NOTAS:EM QUE CONSISTE A DOENÇA?

A esquizofrenia é uma doença mental grave que altera de forma significativa a vida de quem dela sofre e dos seus familiares. Os afectados têm dificuldade em distinguir o que é ou não real, tendo comportamentos estranhos.

QUAIS SÃO AS SUAS CAUSAS?

Não são totalmente conhecidas as causas por detrás da doença. Sabe-se que na sua origem estão factores genéticos e ambientais, afectando uma em cada 100 pessoas. É mais comum manifestar--se na adolescência e em adultos jovens.

QUE SINTOMAS APRESENTA?

Os sintomas são muitos e manifestam-se de forma diferente de pessoa para pessoa. Sabe-se que, em 30 por cento das situações, é uma doença que está associada ao consumo de substâncias tóxicas, aumentando o risco de suicídio.



Carla Marina Mendes
“In correio da manhã de 28/10/2007”

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